Confessionais
Educar para a tecnologia: um desafio para Escolas Católicas
Publicado em 11 de julho de 2024Atualizado em 16 de julho de 2024.
A tecnologia, quando bem utilizada, pode ser uma poderosa ferramenta para a formação integral dos alunos, algo que o Poliedro Sistema de Ensino valoriza e implementa de forma ampla em suas soluções e metodologia. Em se tratando de Escolas Católicas, que buscam alinhar suas práticas pedagógicas aos valores éticos, essa pauta é particularmente importante, tendo em vista a necessidade de alinhar o uso da tecnologia aos valores cristãos trazida pelo Papa Francisco no Laudato Si’.
Para aprofundar essa discussão, convidamos o especialista Jelson Oliveira para o quarto artigo da série de temas voltados para as escolas confessionais.
Leia também os temas anteriores:
- Pacto Educativo Global: um chamado para transformar o mundo
- A governança da Escola Católica à luz dos valores institucionais
- Ensino Religioso: um componente para o currículo brasileiro
Jelson é professor do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da PUCPR, escritor e palestrante em temas ligados à ética, como valores, felicidade, trabalho e questões ambientais. É também pesquisador do CNPq e coordenador do curso de bacharelado em Gestão da Felicidade e Projeto de Vida. Neste conteúdo, sua visão profunda sobre a integração da tecnologia na educação trará insights valiosos para a sua escola.
Acompanhe a seguir o conteúdo do especialista na íntegra.
A convicção do Papa Francisco sobre a educação e a crise ambiental
Já nas primeiras páginas de sua Encíclica Laudato Si’, o Papa Francisco deixa clara a sua convicção de que a educação tem papel fundamental no enfrentamento da emergência ambiental, na medida em que isso exige uma mudança no estilo de vida das pessoas: “convencido — como estou — de que toda mudança tem necessidade de motivações e de um caminho educativo, proporei algumas linhas de maturação humana inspiradas no tesouro da experiência espiritual cristã” (LS, 15). Essa afirmação carrega duas questões importantes: de um lado, ela expressa a convicção do Sumo Pontífice; de outro, ela fundamenta essa convicção na tradição cristã. Justos, esses dois elementos dizem muito para as Escolas Católicas, na medida em que elas são o lugar onde o conhecimento se encontra com a “experiência espiritual cristã”. Sendo assim, em nenhum outro lugar os ideais de Francisco se fazem tão evidentes e ninguém pode incorporá-los de forma mais adequada do que as Escolas Católicas. Ocorre que, para isso, seria preciso reorientar eticamente uma das grandes causas da crise ambiental que nos afeta: a tecnologia.
A tecnologia e a crise ambiental
Apoiando-se nas ideias do filósofo Romano Guardini, o Papa afirma que “o homem moderno não foi educado para o reto uso do poder” da tecnologia, dado que “o imenso crescimento tecnológico não foi acompanhado por um desenvolvimento do ser humano quanto à responsabilidade, aos valores, à consciência” (LS, 105). Assim, a tecnologia não pode ser encaminhada para o bem comum a não ser que esteja nas mãos de pessoas responsáveis, orientadas por valores e com consciência plena de suas benesses e de seus riscos. Ora, é precisamente isso que precisa ser assumido como parte do “programa educativo” das Escolas Católicas, que deveriam contribuir para que a sociedade compreendesse, em primeiro lugar, a ambiguidade dos avanços tecnológicos, que tanto podem trazer benesses para a humanidade quanto grandes perigos e riscos, como aqueles ligados à destruição ambiental e à extinção das espécies.
Educação para o uso ético da tecnologia
Educar para o uso correto da tecnologia é educar para que o seu uso seja realizado de forma coerente, orientado pelos valores da vida e pelo reconhecimento do direito próprio de todas as formas de vida com as quais o ser humano partilha esta casa comum. Não se trata, obviamente, de uma atitude tecnofóbica, mas de uma atitude crítica, capaz de evitar a ingenuidade daqueles que aceitam a tecnologia como eticamente neutra. A posição do Papa é de que cabe à educação preparar os estudantes para garantirem uma orientação ética para a tecnologia, e isso pode ser feito por meio da adoção de “um estilo de vida e uma espiritualidade que oponham resistência ao avanço do paradigma tecnocrático” (LS, 111). Ao falar em “paradigma tecnocrático” (caracterizado como “homogêneo e unidimensional” [LS, 106]), o Papa se refere ao modo de compreender o exercício do poder, que em vez de priorizar a participação das pessoas (especialmente os menos favorecidos), valoriza apenas os interesses e a expertise técnica.
A necessidade de submeter a tecnologia à ética e à política
Para o Papa, é essa visão tecnocrática que tem impedido os países a chegar a um acordo em nível internacional capaz de evitar a destruição da vida. Para ele, “a submissão da política à tecnologia e à finança demonstra-se na falência das conferências mundiais sobre o meio ambiente” (LS, 54). Isso porque, escreve o Pontífice, “a aliança entre economia e tecnologia acaba por deixar de fora tudo o que não faz parte dos seus interesses imediatos” (LS, 54). Ocorre que, deixando de fora as diferentes formas de vida, a tecnologia torna-se cega ao risco que ela mesma representa. A única saída, nesse caso, seria submeter a tecnologia à ética e à política, chamando a atenção para sua responsabilidade diante do cuidado da casa comum.
A educação tecnológica nas Escolas Católicas
A educação tecnológica deve ser um cotidiano na sala de aula, de forma que não apenas pratiquemos uma educação com tecnologia, mas, sobretudo, uma educação para a tecnologia. Em outras palavras, nossas escolas não devem apenas se encher de ferramentas e recursos tecnológicos para apoiar e melhorar o processo educativo. É claro que isso é importante, na medida em que a tecnologia é um instrumento mediador que pode facilitar o ensino e a aprendizagem em várias disciplinas (a exemplo do uso de tablets, laptops e quadros interativos nas salas de aula, aplicativos educacionais, plataformas de aprendizagem on-line, recursos digitais como vídeos, simulações e jogos educacionais etc.). Mas isso não é, por si só, garantia de que as pessoas serão educadas para aquilo que o Papa Francisco considera importante: colocar a tecnologia a serviço da vida. Isso envolve uma educação para a tecnologia precisamente no sentido de que é preciso educar os estudantes sobre a utilização, a aplicação e, principalmente, o impacto da tecnologia na sociedade. Isso significa tematizar criticamente os processos tecnológicos, de forma a incluir nas decisões os interesses da comunidade, dos seres humanos e extra-humanos. Trata-se de educar os agentes tecnológicos do futuro, os criadores e usuários da tecnologia, para que o façam de forma eticamente adequada, levando em conta não apenas o lucro, mas o benefício para o bem comum.
A urgência do cuidado com a criação e a responsabilidade das Escolas Católicas
Não existe outro bem comum mais urgente do que o cuidado com a criação e com a nossa casa comum. Por isso, é preciso reorientar a tecnologia para que ela contribua para a preservação da vida e não, como muitas vezes tem sido o caso, para a destruição das condições da vida, por meio da exploração ilimitada dos recursos naturais. Para o Papa, quando orientada apenas para o lucro, a tecnologia perde seu potencial de benesse e se torna um perigo: “na realidade, a tecnologia, que, ligada à finança, pretende ser a única solução dos problemas, é incapaz de ver o mistério das múltiplas relações que existem entre as coisas e, por isso, às vezes resolve um problema criando outros” (LS, 20). Tematizando a relação complexa entre tecnologia e natureza, o Papa dá um exemplo: “muitos pássaros e insetos, que desaparecem por causa dos agrotóxicos criados pela tecnologia, são úteis para a própria agricultura, e o seu desaparecimento deverá ser compensado por outra intervenção tecnológica que possivelmente trará novos efeitos nocivos” (LS, 34). Ou seja, muitas vezes as promessas da tecnologia e suas intervenções, por ignorarem a complexidade da criação, acabam criando feridas que nunca poderão ser sanadas, abrindo um ciclo exaustivo de repetição que, em vez de solucionar o problema, acaba por acumular mais ameaças.
Assim, para Francisco, “é muito nobre assumir o dever de cuidar da criação com pequenas ações diárias, e é maravilhoso que a educação seja capaz de motivar para elas até dar forma a um estilo de vida” (LS, 211). As Escolas Católicas são lugares de exercício dessa “corajosa revolução cultural” (LS, 114) que é indispensável para que a humanidade possa ter um futuro. Isso implica assumir a sua responsabilidade de cuidar da natureza e de todos os seres vivos, tarefa para o que a Escola Católica é convocada. Para o Papa, “a educação na responsabilidade ambiental pode incentivar vários comportamentos que têm incidência direta e importante no cuidado do meio ambiente” (LS, 114), e é precisamente assim que as Escolas Católicas devem ser reconhecidas: como lugares onde floresça a grande utopia do Reino, sendo a utopia de uma natureza preservada na qual os seres humanos possam viver em equilíbrio com as demais formas de vida. É para isso que todos e todas nós, agentes educativos de Escolas Católicas, somos convocados/as. E nossa acessão deve ser urgente, antes que seja tarde demais. Um dia Dom Pedro Casaldáliga escreveu que “ou a Igreja será ecológica ou não será”. Podemos dizer hoje que “ou a Escola será ecológica ou não será”.
Como o Poliedro apoia as Escolas Católicas?
No Poliedro, acreditamos em uma formação integral e alinhada a valores. Por isso, as escolas confessionais de todo o Brasil que utilizam o Poliedro Sistema de Ensino encontram em nossa equipe o suporte necessário para cumprir sua missão da melhor forma possível, além de iniciativas como eventos e conteúdos que fortalecem seu compromisso com uma educação mais compassiva.
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